data-filename="retriever" style="width: 100%;">Me causa estranheza o tanto de Ibope que foi dado à frase atribuída ao presidente da República (mas que sequer pertence a ele, ao que parece) de que este país é ingovernável. Será que os eleitores são ingênuos a ponto de acharem que um governante de um país subdesenvolvido - ou em desenvolvimento como modernamente se prefere nominar - tem efetivamente liberdade de ação política? Será que todos ignoram que a política é controlada pela economia e que os rumos da economia são ditados pelas grandes corporações que, por sua vez, estão sediadas em países ricos?
A política, desde a concepção de Platão, é o local onde as decisões são tomadas. Mas essa autonomia da política se perdeu ao longo da história. Na sociedade moderna as regras são ditadas pela economia, que é quem coordena as decisões políticas de acordo com os macrointeresses financeiros.
Posso elencar aqui uma série de atitudes adotadas por quem quer que esteja à frente do Executivo ou integre o Legislativo e que demonstram claramente a submissão do país aos ditames econômicos e às diversas facetas manipulatórias que fazem parte do atual jogo político: a aprovação da lei de Propriedade Intelectual no governo de Fernando Henrique Cardoso decorreu da enorme pressão exercida pelos países do norte visando ao monopólio das corporações norte-americanas; as propostas de reforma da Previdência que vêm sendo apresentadas desde o governo de Lula, Dilma e recentemente Bolsonaro têm, entre outros propósitos, o de atender às exigências das agências internacionais de classificação de risco contratadas por grandes corporações; o projeto da "Lei do Veneno", que tramita junto ao Congresso Nacional, capitaneado pela bancada ruralista, visa conceder uma maior permissibilidade às grandes multinacionais agroquímicas incrementando a produção e o uso dos agrotóxicos no país, em detrimento da saúde e do meio ambiente brasileiros. Enfim, para qualquer lado que se olhe a constatação é sempre a mesma: governantes não governam para além dos interesses econômicos internacionais.
Como se não bastasse essa inevitável submissão da política nacional aos imperativos econômicos mundiais há, ainda, os interesses corporativos locais a gerar entraves e inconstâncias no andamento de qualquer governo. E isso não é nenhuma novidade, afinal de contas, Sérgio Abranches, cientista político que cunhou o termo "presidencialismo de coalizão" já defendia, por ocasião da Assembleia Nacional Constituinte de 1987/1988 que a nossa Constituição Federal poderia estar gerando uma democracia ingovernável em face da eleição do Presidente da República se dar de forma dissociada da eleição do parlamento de modo que ele não seja detentor de uma maioria no Congresso Nacional. Isso poderia impossibilitar a aprovação de suas propostas, ainda que relevantes para o país. Será que 30 anos depois a ingovernabilidade de Abranches está tomando forma ou será que ela sempre esteve aí?